quinta-feira, novembro 20, 2003
Propinas e piquês
Quando estamos em casa, de baixa, com a perna esticada e ligeiramente elevada relativamente ao resto do corpo, esperando que o perónio desfissure, lá somos obrigados a fazer um zapping matutino e um zapping vespertino pela nossa TV. É o país real. E o país real, pelos vistos, são as canções do padre Borga e a Maya a adivinhar o futuro num baralho de cartas, e a Rita Ribeiro a falar sobre «gente iluminada», e o Roberto Leal em diálogo com o sr. D. Duarte Pio, e o Rodrigo Leal e o João Leal e uma particular amiga do Roberto, a Cinha Jardim, a cometer enunciados filosóficos sobre as relações luso-brasileiras, e ele é ainda o Toy e o João Malheiro com dossiers sobre futebol debaixo do braço a arrotar postas de pescada, e o Marco Paulo em sessões contínuas, e o Manuel Goucha e as avozinhas do Manel, e o maestro Vitorino d' Almeida, e o José Cid de boina e camisolas de lã a perorar sobre jazz, e o diabo a quatro. E então olhamos a luta dos estudantes contra as propinas de um outro modo. Com alguma simpatia. Porque nos regressa uma vontade imensa de meter cadeados em todas as portas e acender rastilhos. E, por instantes, até suportamos as capas e batinas de cem contos dos meninos. E a sobranceria dos meninos em conferência ao ar livre sobre a possibilidade de sequestrar o sr. Reitor. Agora há uma coisa que não se suporta: é o líder da Associação de Estudantes da Universidade do Algarve, armado em revolucionário de pacotilha, falando à turba de megafone, do alto da sua sua alarve ignorância, supondo que o plural de piquete é «piquês». E portanto era preciso organizar os piquês de defesa dos cadeados dos portões da universidade...