Hoje à noite, na serra, havia figos cheios e em estrela, e havia medronho. E recordámos então uma crónica de Manuel Rosa Dias (esse mesmo, o do DN-J...) publicada na revista SUL há um pouco mais de três anos. É um texto com um pouco mais de sul, uma memória dos sabores antigos. E não se resiste a publicar aqui um excerto - também, ou sobretudo, em nome de uma velha e sempre presente amizade:
«Figos, já disse, é na figueira. Abro uma excepção, vá lá, duas. Ou mesmo três.
A primeira é para os figos secos do almanxar. Estou a ver-me de calções, agachado ao pé das esteiras que, ao fim do dia, o meu pai ia enrolar por causa da brandura da noite. Eu não ajudava nada, passava o tempo catando para a boca os mais direitinhos. As mãos pegajosas do melaço agarrado às canas, um pouco bêbado talvez, mas nunca enjoado desse inesquecível perfume.
Depois, os figos do Maio. Secos e espalmados, acamavam-se em latas ou caixas de papelão e, durante seis ou sete meses, iam ganhando o espírito da erva-doce e de outras plantas aromáticas lá encerradas também. Até que chegava Maio e o tempo da ressurreição. Que cheirinho. E que inveja de não poder, como os mais velhos, acompanhá-los com aguardente de medronho.
Por fim, os figos torrados no forno, com ou sem guarnição de amêndoas. Sendo com elas, já agora que seja em estrela, e os miolos abertos ao meio e descascados»...