De Nuno Júdice, a revista SUL publicou em inícios de 2001 três poemas inéditos. Agora que é tempo dos figos cheios, e dos figos em estrela, será tempo também de partilhar aqui esses versos, essa memória dos frutos que no inverno se tiravam dos frascos para, em segredo, chupar os seus grânulos ou saborear na boca a amêndoa que os recheava. Depois do excerto de uma crónica de Manuel Dias, retomamos aqui uma Antologia da SUL com um poema de Nuno Júdice:
ESTRELAS
Desfaço nas mãos os figos, os fios
fugazes de setembro, enquanto o seu leite
escorre pelas folhas verdes que
os envolvem. Esses figos, metidos
em cestos de vime, eram mel na boca
que os saboreava. Secos, iam parar
aos frascos fechados para o inverno, de onde
os tirava para os meter no bolso,
antes de sair. «O que tens aí?», perguntavas-me. E
eu passava-te para a mão um desses figos, e via
como o abrias, chupando os seus grânulos,
e passeando na boca a amêndoa que
o recheava. Mas hoje, onde estarás?, pergunto. Poderia
ainda partilhar contigo um
desses figos do inverno? Ou o seu leite secou,
no canto dos lábios, roubando-te
as palavras, e o húmido murmúrio
do amor?