quarta-feira, outubro 29, 2003

Um adeus

Discutiam daquela forma civilizada, pedagógica, explicadinha, insuportável. Sem elevar demasiado a voz. Dizendo coisas do género: «mas não penses que a partir dessa altura a minha confiança em ti não ficou definitivamente comprometida». Falavam na rua, em Bensafrim, às 09:00 AM, quase protegidos pela esquina da Travessa que dá para o largo da Vicentina, ela num tom meio ponto acima a sublinhar um adjectivo. A trocarem frases copiadas dos compêndios de ciências sociais. Sem modulações, racionais, como se estivessem imunes à paixão e ao ódio e apenas, em vez do amor, os tocasse a erosão. Despediam-se. Era um adeus. Mas compreendia-se que não havia muito de que se despedirem. E que eles próprios sabiam que essa era a maior tristeza que lhes pesava nos ombros.