História de Harun, da Menina do Mar, da Piratinha e de um pequeno Ouriço
“Sorte?” – perguntou Harun, admirado com o desplante com que a sua conquista fora apontada pelo amigo. Harun era um rapaz do fundo do mar, um pequeno nómada que gostava de passear pelas correntes, pelas ondas, saltar pelos abismos abissais e brincar às escondidas com as tartaruguinhas. E agora o seu pequeno amigo, um Ouriço do mar, dizia que essa liberdade era a sua sorte. Ao contário de Harun, o pequeno Ouriço estava preso à sua cova no rochedo do Penedo da Moreia e não se arriscava a sair de lá de dentro por um instante que fosse, sequer para comer, com receio de ser devorado por um grande peixe.
Harun era livre e valente, cavalgava as vagas das tempestades no dorso dos golfinhos, nadava no meio dos tubarões, media forças com eles, gostava de lhes agarrar no focinho e beliscá-lo com força, porque sabia que assim os irritaria.
E assim o pequeno Ouriço confessava ao seu amigo que gostaria de ser como ele. Mas Harun tinha uma fraqueza, ou melhor, duas: a primeira delas, Harun gostava perdidamente da Menina do Mar. Sentia muitas saudades quando não estava junto dela e passava os dias a imaginar o seu sorriso franco, aberto, muito branco e alinhado. Gostava de recordar os seus dedos a passar pelo cabelo da Menina do Mar, de sentir o carinho da testa dela na sua e sentia falta dos seus beijos de esquimó. Ninguém dava beijos de esquimó como a Menina do Mar. Harun gostava muito do nariz arrebitado da Menina do Mar e queria muito que ele e ela fossem um só e vivessem na mesma casa no Mar da Felicidade. Harun gostava também muito do pequeno Ouriço e por isso prometeu-lhe que se um dia assim fosse, o convidaria a viver com eles para que nunca tivesse medo, porque Harun e a Menina do Mar lhe dariam toda a protecção. A segunda fraqueza de Harun era a Piratinha. Harun gostava muito da Piratinha, que era um menina que percorria todos os oceanos do mundo à procura de tesouros e navios encalhados para neles entrar e explorar o que tinham lá dentro, coisa que Harun também gostava de fazer na companhia da Piratinha.
Ao contrário da Menina do Mar, a Piratinha vivia à superfície do oceano, gostava de histórias para adormecer que Harun gostava de contar e ouvir e por isso Harun gostaria que ela também viesse viver com ele, com a Menina do Mar e com o pequeno Ouriço. Mas a Piratinha não podia, porque dificilmente respiraria debaixo de água e assim o mundo da Menina do Mar, do pequeno Ouriço e o da pequena Piratinha eram diferentes um do outro. E quando Harun realizava isso ficava triste, muito triste, e percebia que se tinha tornado numa criatura que não era do mar, nem da terra, nem respirava na água nem no ar. Harun sufocava num mundo e no outro, não era feliz no fundo do mar nem na superfície, porque no mundo da Piratinha lhe faltavam o Ouriço e a Menina do Mar e no mundo da Menina do Mar lhe faltava a Piratinha.
E assim o tempo passava para Harun. Nos dias de tempestade, Harun fugia para o fundo do mar e nos dias de Sol refugiava-se na superfície, perto da Piratinha. Um e outro lugares eram os oásis de Harun, lugares onde o tempo do relógio parava a par do tempo que fazia. Mas fora dos oásis Harun definhava e perguntava-se se a felicidade tinha de ter aquele preço, ou se podia não ser absoluta e inteira. Porque Harun não queria ter de contar duas histórias, a história de Harun e a Menina do Mar e a história de Harun e a Piratinha como fazia habitualmente e como cada vez mais detestava ter de fazer. Isso disse Harun ao pequeno Ouriço, que o ouviu atentamente e, no final, coçando pensativamente os seus picos com a mão direita, respondeu que não o podia ajudar, porque Harun tinha de continuar e encontrar dentro de si as forças que lhe permitissem viver e fazer felizes a Menina do Mar, a Piratinha e o pequeno Ouriço. E Harun sabia que havia de as encontrar, fosse em que oceano fosse, e para isso contava com a ajuda do pequeno Ouriço. Este prometeu que o ajudaria nesta tarefa e despediu-se de Harun com um beijinho de esquimó. Nessa noite todos, a Menina do Mar, a Piratinha, o pequeno Ouriço e Harun dormiram descansados.
“Sorte?” – perguntou Harun, admirado com o desplante com que a sua conquista fora apontada pelo amigo. Harun era um rapaz do fundo do mar, um pequeno nómada que gostava de passear pelas correntes, pelas ondas, saltar pelos abismos abissais e brincar às escondidas com as tartaruguinhas. E agora o seu pequeno amigo, um Ouriço do mar, dizia que essa liberdade era a sua sorte. Ao contário de Harun, o pequeno Ouriço estava preso à sua cova no rochedo do Penedo da Moreia e não se arriscava a sair de lá de dentro por um instante que fosse, sequer para comer, com receio de ser devorado por um grande peixe.
Harun era livre e valente, cavalgava as vagas das tempestades no dorso dos golfinhos, nadava no meio dos tubarões, media forças com eles, gostava de lhes agarrar no focinho e beliscá-lo com força, porque sabia que assim os irritaria.
E assim o pequeno Ouriço confessava ao seu amigo que gostaria de ser como ele. Mas Harun tinha uma fraqueza, ou melhor, duas: a primeira delas, Harun gostava perdidamente da Menina do Mar. Sentia muitas saudades quando não estava junto dela e passava os dias a imaginar o seu sorriso franco, aberto, muito branco e alinhado. Gostava de recordar os seus dedos a passar pelo cabelo da Menina do Mar, de sentir o carinho da testa dela na sua e sentia falta dos seus beijos de esquimó. Ninguém dava beijos de esquimó como a Menina do Mar. Harun gostava muito do nariz arrebitado da Menina do Mar e queria muito que ele e ela fossem um só e vivessem na mesma casa no Mar da Felicidade. Harun gostava também muito do pequeno Ouriço e por isso prometeu-lhe que se um dia assim fosse, o convidaria a viver com eles para que nunca tivesse medo, porque Harun e a Menina do Mar lhe dariam toda a protecção. A segunda fraqueza de Harun era a Piratinha. Harun gostava muito da Piratinha, que era um menina que percorria todos os oceanos do mundo à procura de tesouros e navios encalhados para neles entrar e explorar o que tinham lá dentro, coisa que Harun também gostava de fazer na companhia da Piratinha.
Ao contrário da Menina do Mar, a Piratinha vivia à superfície do oceano, gostava de histórias para adormecer que Harun gostava de contar e ouvir e por isso Harun gostaria que ela também viesse viver com ele, com a Menina do Mar e com o pequeno Ouriço. Mas a Piratinha não podia, porque dificilmente respiraria debaixo de água e assim o mundo da Menina do Mar, do pequeno Ouriço e o da pequena Piratinha eram diferentes um do outro. E quando Harun realizava isso ficava triste, muito triste, e percebia que se tinha tornado numa criatura que não era do mar, nem da terra, nem respirava na água nem no ar. Harun sufocava num mundo e no outro, não era feliz no fundo do mar nem na superfície, porque no mundo da Piratinha lhe faltavam o Ouriço e a Menina do Mar e no mundo da Menina do Mar lhe faltava a Piratinha.
E assim o tempo passava para Harun. Nos dias de tempestade, Harun fugia para o fundo do mar e nos dias de Sol refugiava-se na superfície, perto da Piratinha. Um e outro lugares eram os oásis de Harun, lugares onde o tempo do relógio parava a par do tempo que fazia. Mas fora dos oásis Harun definhava e perguntava-se se a felicidade tinha de ter aquele preço, ou se podia não ser absoluta e inteira. Porque Harun não queria ter de contar duas histórias, a história de Harun e a Menina do Mar e a história de Harun e a Piratinha como fazia habitualmente e como cada vez mais detestava ter de fazer. Isso disse Harun ao pequeno Ouriço, que o ouviu atentamente e, no final, coçando pensativamente os seus picos com a mão direita, respondeu que não o podia ajudar, porque Harun tinha de continuar e encontrar dentro de si as forças que lhe permitissem viver e fazer felizes a Menina do Mar, a Piratinha e o pequeno Ouriço. E Harun sabia que havia de as encontrar, fosse em que oceano fosse, e para isso contava com a ajuda do pequeno Ouriço. Este prometeu que o ajudaria nesta tarefa e despediu-se de Harun com um beijinho de esquimó. Nessa noite todos, a Menina do Mar, a Piratinha, o pequeno Ouriço e Harun dormiram descansados.