Confesso, abismado, que li atentamente o post do José Carlos de há uns dias e, foi entre a admiração e a completa surpresa que descobri que há um trabalho ainda mais repugnante que o de "Apontador Real", cargo remunerado que constou das folhas de pagamento de ordenados da função pública até 1916, a despeito da implantação da República seis anos antes. Tal funcionário – Apontador - tinha mais ou menos as mesmas competências do popular Lançarote, mas com uma enorme diferença, já que apenas tinha de exercer tais funções com o cavalo real, em dia de arraial (para o cavalo, bem entendido). Perante tal cenário, importa reflectir na natureza essencial das profissões pois, obviamente, uma coisa será uma pessoa dedicar-se ao exercício de tal tarefa auxiliar com um cavalo, real, animal que ainda por cima será de linhagem, contudo apenas e só um único animal (ignoro todavia quão promíscuo será um equídeo, ou quais as suas reais necessidades), por quem o funcionário público até pode criar alguma, digamos, afeição ou, porque não chamar os cavalos pelos nomes, intimidade. Outra coisa, muito diferente, será apontar (ou lançar) um burro, animal de fraca linhagem e nobreza que padece, ao que parece, de fraca pontaria, a despeito do alvo ser uma fêmea de porte superior. Não sendo este o objectivo deste post, naturalmente que não me debruçarei sobre as (fracas) qualidades de um macho que tem dificuldade em concretizar, para utilizar uma linguagem futebolística, um tento com uma fêmea de porte competitivo. Todavia, convirá esgaçar um pouco mais a ideia de que, relativamente ao Apontador ou ao Lançarote, se poderá falar de altruísmo no exercício das suas respectivas profissões. Na verdade, ambos, quais cançonetistas da desfolhada, ficavam após a consumação do acto e sofridos os riscos inerentes, portadores de segredos de alcova dos estábulos e porventura dos demais aposentos reais ou do país campesino, consoante os casos. Imagino mesmo que ambos estariam submetidos a apertada ética no exercício das suas profissões e não poderiam desvendar os segredos que lhes fossem revelados. Imagine-se a desgraça que seria se se soubesse que o cavalo do rei não conseguia cobrir a égua da rainha. Quem conta um ponto aumenta um ponto, e facilmente se chegaria à conclusão que o País estaria governada por um Rei fanchão com fraca inclinação para a arte de bem cavalgar em toda a sela. Provavelmente, tais profissões velariam igualmente pela inexistência do incesto entre filhos e pais da mesma manada e recusariam o préstimo do seu essencial auxílio copulativo entre burros de certa idade e éguas imberbes. Nada de poneifilia, portanto, debaixo dos seus narizes.
Olhando para o Portugal de hoje, dou por mim a pensar na desgraça que representou para o país a queda em desuso do Apontador ou do Lançarote. Salvam-se, afinal, os engraxadores, que nunca precisaram, que se saiba, de Apontadores ou de Lançarores.