Livros. Os nossos, os dos outros, os que não interessam, os que não lemos, os que lemos e relemos, os bons, os maus, os menos bons, os perecíveis, os eternos, os de uma vida, os que escrevemos, os que gostavamos de ter escrito e aqueles a que regressamos por acaso, ou por uma circunstância determinada da vida que nem sempre sabemos ou queremos explicar. Alguns, quando se tornam imortais, têm o dom de enriquecer com o passar dos anos e adquirem o dom de se tornarem sábios conselheiros, por vezes companheiros silenciosos para junto de quem regressamos furtivamente nas noites em que a velocidade das ideias e a falta de sono nos pregam partidas; no fundo, esta é a história do conforto que sentirmos por saber que alguém já passou pelo mesmo.
Enfim, vinha isto a propósito de um livro a que involuntariamente regresso cíclica e episodicamente, mas que não voltei a abrir desde o dia em que terminei a sua leitura. Vejo-o na estante, exactamente no mesmo sítio em que o deixei há uns anos, a lombada um pouco amarelecida e gasta pelo tempo, mas intacto. “Os Comediantes”, de Graham Greene, é um misto de ficção e realidade que nos transporta ao Haiti dos primeiros tempos da ditadura de Duvalier (Papa Doc) no momento em que este chegou ao poder a coberto da polícia secreta dos Tonton Macoute. "Os Comediantes" retrata os reflexos que da ditadura advieram para os diversos estratos da população haitiana e estrangeira num universo de terror, miséria, sadismo, práticas vodu e episódios burlescos. A narrativa centra a sua acção num pequeno grupo heterogéneo de estrangeiros que viaja a bordo de um navio holandês e é (literalmente) desembarcado e votado ao abandono nesse Haiti sufocante que nos é dado a conhecer. Os membros do grupo concentram-se numa estalagem perto da capital de onde entram e saem centrando-se a história em torno da atitude com que todos enfrentam o mundo hostil que os rodeia, assumindo cada personagem uma marcada indiferença perante tudo, todos e o seu próprio destino, transformados que são em “comediantes” na terra de Papa Doc.
Qui plus est, “Os comediantes” retrata os medos escondidos, as misérias e os podres de uma sociedade que pode muito bem ser reduzida à nossa escala de tragédia moral, mas em que sobretudo releva a aparente indiferença em que nela cada um vive. ”Os Comediantes” é uma obra a que, mais por gesto irreflectido que por gosto ou necessidade pessoais, regresso episodicamente para relativizar a gravidade do quotidiano com uma indiferença que se quer quase redentora.
Qui plus est, “Os comediantes” retrata os medos escondidos, as misérias e os podres de uma sociedade que pode muito bem ser reduzida à nossa escala de tragédia moral, mas em que sobretudo releva a aparente indiferença em que nela cada um vive. ”Os Comediantes” é uma obra a que, mais por gesto irreflectido que por gosto ou necessidade pessoais, regresso episodicamente para relativizar a gravidade do quotidiano com uma indiferença que se quer quase redentora.