Quando o Verão partia ficava sempre triste. Porque era o fim do nosso reencontro, mesmo que não me ligasses nenhuma, não partilhasses o teu gelado e te sentasses ao lado de todos menos de mim na matiné do velho cinema. Rias-te das piadas dos outros, do que te diziam e gostavas que os rapazes mais velhos te admirassem, o que me magoava porque achava que eles abusavam de ti e tu deixavas. Foi assim durante anos, demasiados anos, tantos quantos os que demorei a crescer e a abandonar a infância e o início da adolescência.
De repente, num Verão, bateste-me à porta, convidaste-me para um passeio no empedrado da marginal, aquela que calcorreei anos a fio, de noite, à tua procura nas noites de Verão e depois da tua recordação no Inverno, desesperando por não te encontrar. Mas nesse Verão, sem aviso, subitamente, ambos crescemos, e já não te consegui achar a mesma piada. Lembro-me de desejar que esse Verão não tivesse existido e corri a refugiar-me no meu quarto. Até mudei de praia. Na semana seguinte enamorei-me por outra rapariga, mas durou pouco e nunca mais a vi quando o Verão terminou, nem a ti, depois me cruzar contigo enquanto segurava na mão dela. Excepto hoje. Anos volvidos, na velha marginal caminhavas com um menino, certamente teu neto, pela mão; eu estava sentado no banco em frente ao que resta do velho cinema Mariani e tinha a minha neta sentada ao colo. Não me reconheceste, ou pelo menos fingiste-o, mas as pedras da calçada revelaram-me que o riso de menina que ouvi era o teu.