terça-feira, dezembro 07, 2004

A via moderna

Há, na via moderna de acesso à Nova Democracia, apregoada por Jerónimo de Sousa no seu discurso de tomada de posse como secretário-geral do PCP, algo de bafiento e simultaneamente novo: as referências ao operariado, aos assalariados, à exploração dos trabalhadores pelos capitalistas desprovidos de valores em relação à classe operária... O espantoso é que tudo isto ainda foi prontamente aclamado por uma militante das bases que teve o seu momento de glória ao conseguir citar um discurso pronunciado por Álvaro Cunhal, se não me engano, na campanha para as legislativas de 82, que terminava com um redondo "viva o Marxismo, viva o Leninismo!".
Obviamente, tudo isto terá a sua graça se situado num contexto histórico, mas no Portugal e na Europa do séc. XXI representa o canto do cisne do comunismo (na Europa civilizada há muito este deu o seu último suspiro) e a chegada dos problemas que lhe andam associados. É que, esvaziado o lugar que este ocupava, os poucos que ainda com ele se identificam e identificavam ficam vazios de objectivos, à deriva, e facilmente caem nos extremismos de esquerda e de direita porque os opostos, como se sabe, facilmente se atraem. Não são os operários, nem os assalariados que me preocupam, como facilmente se perceberá, esses fizeram a sua transição suave a relativamente esclarecida para o socialismo de mercado e para a social-democracia. São os outros, aqueles a quem estes voltaram costas na sua luta de há vinte e trinta anos em busca da liberdade e que cresceram com as referências que agora encontram moribundas, que me preocupam. São os filhos dos operários, dos lutadores, dos explorados, dos assalariados de primeiro grau, esses, os maiores revoltados da nossa franja social. São esses, os filhos dos "outros" de outrora, que a exemplo do que se passa na Europa, alimentam as fileiras dos movimentos extremistas, quem me preocupa, pelo flagelo que podem representar na construção da - o termo afinal é correcto - nova democracia, naquilo em que este conceito, velho de três mil anos pode ser reinventado.