Passaram quatro anos... já quatro anos!... Ainda ontem me brindaste com uma primeira palavra. O brilho do teu sorriso aqueceu-me o coração. Cada dia foi melhor que o anterior, cada experiência mais gratificantes que todas as outras. Quero ser teu para sempre, mas sei que um dia terei de abdicar de ti. É a vida, a lei da vida; é pena que assim seja, ainda bem que assim é. Por ti cresci um pouco mais, crescerei ainda muito mais; a ti te devo muito do que sou hoje, ensinaste-me o amor no estado puro, desinteressado e altruísta que eu pensava já conhecer e verifiquei que não. Porque nem sequer espero que me ames, ou que me retribuas cada segundo que te dediquei, cada noite que perdi a olhar para ti. Enquanto não entraste na minha vida, achava que tudo era complicado, que o mundo era um lugar difícil para se viver, a despeito do meu optimismo silencioso. E no entanto, a tua fragilidade ensinou-me que nada é assim, nada pode ser complicado se visto através da inocência do teu olhar.
Lembro-me de cada noite em que adormeci contigo nos braços, cada noite de insónia que me deste, de longos passeios pelo corredor lá de casa, altas iam por vezes as horas na noite. Lembro-me de cada passo teu, de cada respiração pesada que tinhas e me inquietava. Sei que um dia sentirei falta destas preocupações e dos amuos que hoje, por vezes, tens, mas que passam em seguida. Tu e eu, hoje, não consguimos ficar zangados um com o outro por tempo a que se possa chamar tempo. Tenho receio que nem sempre possa ser assim e que um dia deixe de ser assim.
Queria tornar perpétuos estes instantes, queria que se prolongassem para sempre, assim, mas temo que tenhamos de continuar a crescer. Ambos temos ainda muito caminho por trilhar, juntos e, depois, também, separados. Hoje não lerás estas linhas, porque não sabes que existem; mesmo que soubesses não lhes saberias dar o devido significado ou já dás, mas de uma forma que é só tua. Espero, como numa garrafa solta à deriva no oceano, que um dia te cheguem estas palavras, numa praia da vida. Espero que passem por promontórios e escolhos e te transmitam amanhã o que hoje me apetece dizer-te e não saberia transformar nas tuas palavras.
Queria transmitir-te mais, muito mais, mas aspiro por que ainda possa soltar mais palavras ao vento e ao mar; anseio ainda ter esse tempo, teu e meu. Espero que ainda tenhamos esse tempo.
Amo-te filha. Parabéns pela tua quarta Primavera.
Teu pai.
PS: Foi bom voltar, ao fim de todos estes meses, a Um Pouco Mais de Sul.
sexta-feira, abril 30, 2004
[Antígona]
Dirão talvez que a
morte não recusa a indulgência
às vezes apetece desistir a
meio da corrida
e entregar o corpo à tempestade
Outros se levantam na vertente declivosa
de novo se levantam sem
contar as sílabas
sem medir o lucro
a cerveja a juventude as esplanadas o
amor, podia
ser tudo tão simples
morte não recusa a indulgência
às vezes apetece desistir a
meio da corrida
e entregar o corpo à tempestade
Outros se levantam na vertente declivosa
de novo se levantam sem
contar as sílabas
sem medir o lucro
a cerveja a juventude as esplanadas o
amor, podia
ser tudo tão simples
quinta-feira, abril 29, 2004
[O verão quente]
Ficaram primeiro rendidos ao fascínio das frases,
à melancólica exultação das pausas, à capacidade
de evocação de coisas e lugares. Foi no ano em
que as águas desceram até às curvas de nível
da raiz do junco e os retornados ergueram nos
pátios o desenho das periferias urbanas,
as fasquias e os caixotes de contraplacado,
os panos de tenda, as tábuas encostadas
às paredes de cimento dos anexos. Em cima dos
palcos, nas varandas, nos muros dos tanques,
os acrobatas ágeis moviam archotes e
iluminavam as plateias com o fascínio das frases.
Os alti-falantes do largo, a música das fitas de
plástico e a cerveja a correr nos balcões metálicos
dos bares, os discursos na escola primária,
os cartazes afixados na porta dos armazéns
ou distribuídos à mão em dias de mercado. E só
depois o Verão. E eles rendidos ao lume
avassalador dos archotes, ao fascínio das frases.
à melancólica exultação das pausas, à capacidade
de evocação de coisas e lugares. Foi no ano em
que as águas desceram até às curvas de nível
da raiz do junco e os retornados ergueram nos
pátios o desenho das periferias urbanas,
as fasquias e os caixotes de contraplacado,
os panos de tenda, as tábuas encostadas
às paredes de cimento dos anexos. Em cima dos
palcos, nas varandas, nos muros dos tanques,
os acrobatas ágeis moviam archotes e
iluminavam as plateias com o fascínio das frases.
Os alti-falantes do largo, a música das fitas de
plástico e a cerveja a correr nos balcões metálicos
dos bares, os discursos na escola primária,
os cartazes afixados na porta dos armazéns
ou distribuídos à mão em dias de mercado. E só
depois o Verão. E eles rendidos ao lume
avassalador dos archotes, ao fascínio das frases.
quarta-feira, abril 28, 2004
Deixa lá
Muitas vezes são os eleitos que falham nos momentos decisivos. Só os medíocres têm como seguro o reino dos céus.
Alianças
Pauleta só vê a baliza. Às vezes recebe a bola em posição difícil e ainda assim insiste no remate mesmo que haja um colega melhor colocado a quem passar a bola para um golo certo. Excelente: um avançado que só vê a baliza. Um avançado que assume o risco em permanência e que nunca estaria disponível para a paz comprometida, feita de cedências estratégicas, de um governo de coligação.
Em trânsito
As mulheres mais bonitas da cidade nem sempre estão no Forum Algarve: às vezes estão ainda a caminho.
Escolhas
Uma cidade é um corpo orgânico que não depende apenas das acções de planeamento. E ainda bem. Mas o crescimento da cidade, e o modo como ela se relaciona com as pessoas que aí vivem e trabalham, e com quem a visita, é, no essencial, o resultado de modelos e estratégias de planeamento e ordenamento. Ou seja: ela é o resultado das escolhas que fizermos. Por isso não chega apenas lamentarmo-nos porque demoramos uma hora para entrar ou sair da cidade, ou porque não temos onde estacionar, ou porque os prédios de quinze pisos nos impedem a percepção da paisagem envolvente e estendem uma sombra sobre a avenida, ou porque não temos espaço público, ou porque as ruas estão desertas durante a noite, ou porque se estaciona em cima dos passeios e os peões andam no asfalto supostamente destinado à circulação automóvel, ou porque o comércio tradicional definha e estiola. É assim porque nós escolhemos assim. Ponto.
Estacionar
Não sou adepto dos centros comerciais. Desagrada-me essa espécie de apêndice que não tem relação com as vivências da cidade. Mas uso. E, entre outras vantagens não despiciendas relativamente ao comércio tradicional, agrada-me a ideia de ir às compras (comprar um livro ou uma talocha) sem a angústia prévia, tradicional nas outras partes da cidade, de saber onde estacionar.
Michael Kohlhaas e a ordem do mundo
A queixa: «Todavia passaram meses e estava prestes a cumprir-se um ano sem que ele recebesse da Saxónia uma simples declaração acerca da queixa apresentada em juízo, e muito menos a sentença. Depois de ter várias vezes reclamado junto do tribunal, perguntou ao seu advogado, em carta confidencial, a razão de um atraso tão excessivo, sabendo então que a queixa tinha sido mandada arquivar em consequência da intervenção de uma alta personalidade. A uma nova carta em que o negociante manifestava o seu espanto e perguntava o motivo de tal coisa, o advogado informou que o barão von Tronka era aparentado com dois fidalgos, Hinz e Kunz von Tronka, um dos quais era copeiro e o outro camareiro do Príncipe. Além do mais, aconselhava-o a, sem se obstinar no recurso a vias legais, procurar recuperar os cavalos que se encontravam em Tronkenburgo, avisava-o de que o barão, que naquele momento se encontrava na capital, parecia ter dado à sua gente ordem para lhos entregar, e concluía pedindo-lhe que, se uma tal solução não lhe agradasse, o dispensasse, pelo menos a ele, de insistir posteriormente na mesma causa.»
O despacho: «Decorrido esse tempo, tal como tinha previsto, Herse regressou do Brandeburgo, um pouco aliviado pelo tratamento, e com uma carta do governador acompanhada por um longo despacho. Naquela dizia-lhe sentir-se pesaroso por não poder fazer nada, afinal, pela sua causa; remetia-lhe o despacho recebido da chancelaria de Estado e aconselhava-o a retomar os cavalos deixados no castelo de Tronka, esquecendo o restante da sua queixa. A deliberação da chancelaria tinha o seguinte tom: ele, Kohlhaas, segundo o tribunal de Dresde, era um queixoso que não tinha mais que fazer; o barão, em casa de quem tinha deixado os cavalos, não lhos retinha de modo algum; que os mandasse buscar ao castelo ou indicasse onde lhe deviam ser enviados; que, de qualquer modo, não incomodasse mais a chancelaria de Estado com semelhantes intrigas e querelas.»
Restabelecer-se a ordem: «Cada vez que ouvia um ruído no pátio olhava para lá, na mais tormentosa expectativa que alguma vez lhe agitara o coração: a de ver os criados do barão aparecerem para lhe devolver os cavalos magros e esfomeados, talvez com palavras de desculpa, único caso em que a sua alma, educada na escola da vida, se teria resignado a qualquer coisa que não correspondia de modo algum àquilo que sentia. Mas pouco tempo depois veio a saber, por um viajante seu conhecido, que no castelo de Tronka continuavam a utilizar os cavalos nos trabalhos de lavoura do mesmo modo que os animais do barão, e, através da dor de descobrir o mundo em tão tamanha desordem, teve a alegria de ver restabelecer-se a ordem no seu próprio coração.»
Intimação: «[Michael Kohlhaas] sentou-se e redigiu uma sentença na qual, em nome do direito das gentes, condenava o barão Venceslau von Tronka a devolver no prazo de três dias, entregando-os em Kohlhaasenbrück, os murzelos que lhe tirara e arruinara nos trabalhos da lavoura, devendo cevá-los pessoalmente nas suas cavalariças.»
A visita a Martinho Lutero: «Lutero, com uma expressão contrariada, juntou os papéis que tinha espalhados na escrivaninha e calou-se. A atitude de desafio que aquele homem singular tomava em relação ao Estado contrariava-o, e, voltando a pensar na intimação que ele enviara de Kohlhaassenbrück ao barão, perguntou-lhe o que pretendia ele afinal do tribunal de Dresde. Kohlhaas respondeu:
- O castigo do barão em conformidade com a lei, a restituição dos cavalos no estado anterior e indemnização pelos prejuízos que tanto eu como o meu criado Herse sofremos com a violência de que fomos vítimas.»
Heinrich von Kleist: Michael Kohlhaas, o Rebelde. Editorial Inova, Porto, 1973. Tradução de Egito Gonçalves.
O despacho: «Decorrido esse tempo, tal como tinha previsto, Herse regressou do Brandeburgo, um pouco aliviado pelo tratamento, e com uma carta do governador acompanhada por um longo despacho. Naquela dizia-lhe sentir-se pesaroso por não poder fazer nada, afinal, pela sua causa; remetia-lhe o despacho recebido da chancelaria de Estado e aconselhava-o a retomar os cavalos deixados no castelo de Tronka, esquecendo o restante da sua queixa. A deliberação da chancelaria tinha o seguinte tom: ele, Kohlhaas, segundo o tribunal de Dresde, era um queixoso que não tinha mais que fazer; o barão, em casa de quem tinha deixado os cavalos, não lhos retinha de modo algum; que os mandasse buscar ao castelo ou indicasse onde lhe deviam ser enviados; que, de qualquer modo, não incomodasse mais a chancelaria de Estado com semelhantes intrigas e querelas.»
Restabelecer-se a ordem: «Cada vez que ouvia um ruído no pátio olhava para lá, na mais tormentosa expectativa que alguma vez lhe agitara o coração: a de ver os criados do barão aparecerem para lhe devolver os cavalos magros e esfomeados, talvez com palavras de desculpa, único caso em que a sua alma, educada na escola da vida, se teria resignado a qualquer coisa que não correspondia de modo algum àquilo que sentia. Mas pouco tempo depois veio a saber, por um viajante seu conhecido, que no castelo de Tronka continuavam a utilizar os cavalos nos trabalhos de lavoura do mesmo modo que os animais do barão, e, através da dor de descobrir o mundo em tão tamanha desordem, teve a alegria de ver restabelecer-se a ordem no seu próprio coração.»
Intimação: «[Michael Kohlhaas] sentou-se e redigiu uma sentença na qual, em nome do direito das gentes, condenava o barão Venceslau von Tronka a devolver no prazo de três dias, entregando-os em Kohlhaasenbrück, os murzelos que lhe tirara e arruinara nos trabalhos da lavoura, devendo cevá-los pessoalmente nas suas cavalariças.»
A visita a Martinho Lutero: «Lutero, com uma expressão contrariada, juntou os papéis que tinha espalhados na escrivaninha e calou-se. A atitude de desafio que aquele homem singular tomava em relação ao Estado contrariava-o, e, voltando a pensar na intimação que ele enviara de Kohlhaassenbrück ao barão, perguntou-lhe o que pretendia ele afinal do tribunal de Dresde. Kohlhaas respondeu:
- O castigo do barão em conformidade com a lei, a restituição dos cavalos no estado anterior e indemnização pelos prejuízos que tanto eu como o meu criado Herse sofremos com a violência de que fomos vítimas.»
Heinrich von Kleist: Michael Kohlhaas, o Rebelde. Editorial Inova, Porto, 1973. Tradução de Egito Gonçalves.
terça-feira, abril 27, 2004
O olhar
O mundo não existe enquanto realidade autónoma. O mundo é sempre função do olhar: do olhar de cada um de nós sobre o mundo.
Ainda o olhar
Não há uma 'ordem do mundo'. Há a nossa ideia do que é (ou deveria ser) a ordem do mundo.
Os grupos
Num grupo, em qualquer grupo, os diferentes olhares individuais aproximam-se no modo de entender o mundo. Em alguns desses grupos (num partido político ou num clube de motards, por exemplo), o mais certo é que, aos poucos, esses olhares acabem por coincidir. Não por uma convergência progressiva dos 'modos de ver', mas por uma voluntária privação do que, no olhar, é único, e distingue cada um de todos os outros.
Diacronia
O poder, de um modo geral, não apenas leva a que os olhares dos correligionários, num determinado momento, coincidam: mais que isso, cada um desses olhares se vai deslocando, conforme cada um dos outros se desloca, garantindo que essa coincidência se mantém no tempo. (As rupturas acontecem quando um dos olhares, ou vários, começa a recuperar a capacidade própria de 'ver'.)
Michael Kohlhaas, o Rebelde
Por razões administrativas (a suposta falta de um salvo-conduto), Michael Kohlhaas, a meio da viagem de negócios, vê-se obrigado a deixar dois cavalos como penhor nos domínios do barão Venceslau von Tronka. Dirige-se ao estábulo, contrata um rapaz a quem confia a segurança e o bem-estar dos animais, e segue viagem. Mais tarde, quando regressa para reaver os cavalos, encontra-os num estado lastimoso, usados de um modo vil nos trabalhos do campo, e fica a saber que o rapaz a quem pagara e confiara a guarda dos animais havia sido espancado e expulso logo depois da sua partida. Apesar da indignação, dispunha-se a abandonar o local e a esquecer o sucedido. Mas acaba por conhecer os pormenores da história, e compreende que há na arbitrariedade do barão alguma coisa que contraria profundamente o seu entendimento do mundo.
E é essa a história de Michael Kohlhaas, o Rebelde, de Heinrich von Kleist: por causa de dois cavalos que não lhe são restituídos nas condições em que fora obrigado a deixá-los, passará o resto da vida, armado de ferro e fogo, disposto a repor a 'ordem do mundo'.
E é essa a história de Michael Kohlhaas, o Rebelde, de Heinrich von Kleist: por causa de dois cavalos que não lhe são restituídos nas condições em que fora obrigado a deixá-los, passará o resto da vida, armado de ferro e fogo, disposto a repor a 'ordem do mundo'.
domingo, abril 25, 2004
SOPHIA
«Neste últimos tempos é certo a esquerda fez erros
Caiu em desmandos confusões praticou injustiças
Mas que diremos da longa tenebrosa e perita
Degradação das coisas que a direita pratica?
Que diremos do lixo do seu luxo - de seu
Viscoso gozo da nata da vida - que diremos
De sua feroz ganância e fria possessão?
Que diremos de sua sábia e tácita injustiça
Que diremos de seus conluios e negócios
E do utilitário uso dos seus ócios?
Que diremos de suas máscaras alibis e pretextos
De suas fintas labirintos e contextos?
Nestes últimos tempos é certo a esquerda muita vez
Desfigurou as linhas do seu rosto
Mas que diremos da meticulosa eficaz expedita
Degradação da vida que a direita pratica?»
Julho de 1976
[Sophia de Mello Breyner Andresen: Antologia. Figueirinhas, 1985.]
Caiu em desmandos confusões praticou injustiças
Mas que diremos da longa tenebrosa e perita
Degradação das coisas que a direita pratica?
Que diremos do lixo do seu luxo - de seu
Viscoso gozo da nata da vida - que diremos
De sua feroz ganância e fria possessão?
Que diremos de sua sábia e tácita injustiça
Que diremos de seus conluios e negócios
E do utilitário uso dos seus ócios?
Que diremos de suas máscaras alibis e pretextos
De suas fintas labirintos e contextos?
Nestes últimos tempos é certo a esquerda muita vez
Desfigurou as linhas do seu rosto
Mas que diremos da meticulosa eficaz expedita
Degradação da vida que a direita pratica?»
Julho de 1976
[Sophia de Mello Breyner Andresen: Antologia. Figueirinhas, 1985.]
O futuro
Grândola, a vila morena, já definiu os princípios estratégicos do seu desenvolvimento futuro: o golfe. Grândola pretende, a curto prazo, com sete campos, afirmar-se como destino de eleição da modalidade. À sombra, presume-se, duma azinheira.
Logo se vê
Cavaco Silva apresentou em Grândola, aclamado por populares que o incentivaram a entrar na corrida à presidência da República, o segundo volume da sua Autobiografia Política. Carlos Beato, presidente da Câmara e um dos capitães de Abril que acompanharam Salgueiro Maia na coluna militar que rumou a Lisboa na noite de 24 de Abril, não escondeu a sua admiração por Cavaco Silva, considerando (cf. DN) «ser ainda cedo para se pronunciar sobre a provável candidatura do ex-líder do PSD».
Permitir a opinião livre, às vezes
A propósito da rejeição, pela oposição, das Grandes Opções do Plano para 1987, Aníbal Cavaco Silva escreve na sua Autobiografia Política:
«Decidi convocar uma reunião da Comissão Política Nacional do partido para discutir o assunto. No início da reunião sublinhei mesmo que, face à gravidade da situação política que se vivia, gostaria de ouvir a opinião livre de cada um.»
«Decidi convocar uma reunião da Comissão Política Nacional do partido para discutir o assunto. No início da reunião sublinhei mesmo que, face à gravidade da situação política que se vivia, gostaria de ouvir a opinião livre de cada um.»
Afirma José António Saraiva (cf. Expresso)
«A emoção das revoluções só se vive uma vez.»
«Todas as comemorações têm qualquer coisa de falso, porque são a tentativa de repetir um sentimento único.»
«Nas comemorações as pessoas fingem-se felizes - mas, na verdade, não o estão.»
«Olhamos para os capitães de Abril, que eram jovens capitães nessa altura, e achamo-los velhos - o que faz aumentar a nostalgia.»
«As comemorações provocam-me um sentimento que está exactamente no extremo oposto do entusiasmo com que se vivia a revolução. Mais do que inúteis, julgo que as comemorações são contraproducentes.»
«A memória que tenho do 5 de Outubro, por exemplo, é a de meia dúzia de velhotes celebrando qualquer coisa que eu não entendia mas que me parecia muito antiga, porque a associava à imagem dos celebrantes.»
«As novas gerações detestam comemorações.».
«Para os jovens, que não viveram a data, deverá ser deprimente assistirem em silêncio ao espectáculo de um punhado de idosos contemplando um acontecimento ocorrido na época em que eram jovens.»
«Todas as comemorações têm qualquer coisa de falso, porque são a tentativa de repetir um sentimento único.»
«Nas comemorações as pessoas fingem-se felizes - mas, na verdade, não o estão.»
«Olhamos para os capitães de Abril, que eram jovens capitães nessa altura, e achamo-los velhos - o que faz aumentar a nostalgia.»
«As comemorações provocam-me um sentimento que está exactamente no extremo oposto do entusiasmo com que se vivia a revolução. Mais do que inúteis, julgo que as comemorações são contraproducentes.»
«A memória que tenho do 5 de Outubro, por exemplo, é a de meia dúzia de velhotes celebrando qualquer coisa que eu não entendia mas que me parecia muito antiga, porque a associava à imagem dos celebrantes.»
«As novas gerações detestam comemorações.».
«Para os jovens, que não viveram a data, deverá ser deprimente assistirem em silêncio ao espectáculo de um punhado de idosos contemplando um acontecimento ocorrido na época em que eram jovens.»
Não fugir das comemorações
Ao contrário de José António Saraiva, há quem não tenha das comemorações do 5 de Outubro a imagem de uma celebração de qualquer coisa que não se compreende. Ao contrário de José António Saraiva, há quem não associe a revolução de Abril às rugas e às olheiras coevas dos capitães desse tempo. Ao contrário do que pensa José António Saraiva, há jovens que não detestam comemorações. Ao contrário de José António Saraiva, há jovens que não acham deprimente o espectáculo das comemorações de Abril. Ao contrário de José António Saraiva, há quem lamente que o valioso património político do Expresso se dilua assim, como caca de bebé, nos editoriais da página 3.
sábado, abril 24, 2004
Um mar evolutivo
A manhã começou com o vento de leste a ondular as águas. Mas a tarde trouxe um mar chão. Um mar totó, subserviente, funcionário, liso, leve, como se estivesse a precisar dum 25 de Abril.
sexta-feira, abril 23, 2004
[os fiéis]
[Ésquilo, Os Persas]
A ignomínia não poderia
tocar-nos, a nenhum cântico fúnebre, a
nenhuns destroços de guerra
seria dado sobressaltar uns
corações assim
guardados pela indiferença
A ignomínia não poderia
tocar-nos, a nenhum cântico fúnebre, a
nenhuns destroços de guerra
seria dado sobressaltar uns
corações assim
guardados pela indiferença
quinta-feira, abril 22, 2004
Tarde
Estas crianças a brincar no recreio, correndo, saltando, cantando, felizes, às vezes parecem inverosímeis.
O cartão amarelo
Ao olhar os cartazes do PS para as europeias, plantados ao longo da 125, não posso deixar de sorrir a tristeza de assistir a este esforçado processo de descredibilização da sua própria classe que os políticos teimam em prosseguir. Notável... Quem é que mostra o ostensivo cartão amarelo do cartaz? Sousa Franco? O árbitro que passou as duas últimas noites na zona prisional da directoria do Porto da Polícia Judiciária? Ferro Rodrigues? O árbitro que foi já intimado da suspensão de toda e qualquer actividade desportiva? Markus Merk, que ontem manquejou a sua classe no relvado do Estádio do Dragão?
Depois queixam-se.
Depois queixam-se.
quarta-feira, abril 21, 2004
Um intervalo
Com a recente criação da Direcção Geral dos Recursos Florestais (cujo decreto fundador reconhece a floresta como «património essencial à economia do País e ao seu desenvolvimento sustentável»), o Algarve, em termos de estrutura orgânica do sector, passa de uma direcção de serviços e de quatro chefias de divisão para uma única chefia de divisão que, por sua vez, despachará com os superiores instalados... em Évora. No Algarve, em 2003, arderam mais de sessenta mil hectares de floresta. Quando se exigia um esforço mobilizador para os desafios que se colocam não apenas ao nível da reflorestação como dos mecanismos de gestão e prevenção, esta despromoção não pode deixar de se considerar preocupante - mais ainda se tivermos em conta que a restruturação do sector ocorre exactamente a par da criação da Grande Área Metropolitana, supostamente num esforço de descentralização administrativa acompanhado de novas competências e responsabilidades para a Região.
A meio do processo da Casa Pia, com o início da operação Apito Doirado, com os rumores de separação de dois famosos actores da telenovela e com o Euro-2004 à porta, talvez não fosse mau preservarmos alguns breves momentos de lucidez, racionalidade e espírito crítico.
A meio do processo da Casa Pia, com o início da operação Apito Doirado, com os rumores de separação de dois famosos actores da telenovela e com o Euro-2004 à porta, talvez não fosse mau preservarmos alguns breves momentos de lucidez, racionalidade e espírito crítico.
terça-feira, abril 20, 2004
Uma carta
Hoje recebi uma carta. Não, não foi um mail. Foi uma carta. Uma carta verdadeira. Como antigamente. Com um envelope, um selo dos correios, um carimbo. Com o endereço escrito em tinta permanente numa vagarosa caligrafia. Com uma folha no interior, manuscrita, dobrada em quadro.
Há pequenas coisas que fazem toda a diferença. E às vezes esquecemo-nos que a felicidade pode ser o somatório de pequenas coisas que fazem toda a diferença.
Há pequenas coisas que fazem toda a diferença. E às vezes esquecemo-nos que a felicidade pode ser o somatório de pequenas coisas que fazem toda a diferença.
domingo, abril 18, 2004
sábado, abril 17, 2004
Administração interna
Ao contrário dos fogos florestais, os fogos do amor podem-se combater mas não se podem prevenir.
sexta-feira, abril 16, 2004
Histórias do meu amigo hipocondríaco
Tromboses: «O Júlio tem que ter cuidado. É analfabeto. Está, portanto, particularmente sujeito aos ABC’s.»
Dormir: «Sim, é verdade que estive a noite toda acordado. Consegui não adormecer. Que queres? Estava com a ideia fixa de que ia passar a noite a sonhar que tinha insónias...»
Dormir: «Sim, é verdade que estive a noite toda acordado. Consegui não adormecer. Que queres? Estava com a ideia fixa de que ia passar a noite a sonhar que tinha insónias...»
quinta-feira, abril 15, 2004
Lições de filosofia política
Vê-se que Aníbal Cavaco Silva leu Aristóteles e pescou à linha nas suas teorias sobre o riso, eventualmente por interpostos comentários de Tomás de Aquino. É assim que Cavaco Silva vê alguma virtude no brincar, compreendendo que o riso pode ter um módico de utilidade. Por exemplo, no aliviar de tensões que por um instante estejam a prejudicar o desenvolvimento das actividades sérias. Mas, claro, apenas com esse objectivo e a espaços alargados (digamos: de dois em dois meses), regressando-se de imediato, depois do breve e contido riso, ao rigor do siso. A leitura, no entanto, deverá ter sido parcial: porque Cavaco contrapõe o riso ao carácter produtivo, e isso é que parece que não vinha assim tão claro no Aristóteles... Já de mais difícil filiação é a teoria que relaciona a existência de intervalos nas reuniões de trabalho com o aumento dos graus de desordem.
Para se compreender melhor, vejam-se estes dois excertos da sua Autobiografia Política:
A ideia da desordem: «Na condução dos trabalhos do Conselho [de Ministros] procurei sempre manter o formalismo necessário à afirmação e preservação da dignidade do órgão. (...) Poucas vezes fiz intervalo; os intervalos davam-me a ideia de desordem, cada um a andar para o seu lado, a entrar e a sair da sala, uma imagem de pouca dignidade.»
Rir mantendo a compostura: «Alguns ministros com maior sentido de humor, como Álvaro Laborinho Lúcio, tinham às vezes 'saídas' nas suas intervenções que punham todos a rir. Mas a compostura era sempre mantida e os trabalhos rapidamente readquiriam o seu carácter sério e produtivo.»
Para se compreender melhor, vejam-se estes dois excertos da sua Autobiografia Política:
A ideia da desordem: «Na condução dos trabalhos do Conselho [de Ministros] procurei sempre manter o formalismo necessário à afirmação e preservação da dignidade do órgão. (...) Poucas vezes fiz intervalo; os intervalos davam-me a ideia de desordem, cada um a andar para o seu lado, a entrar e a sair da sala, uma imagem de pouca dignidade.»
Rir mantendo a compostura: «Alguns ministros com maior sentido de humor, como Álvaro Laborinho Lúcio, tinham às vezes 'saídas' nas suas intervenções que punham todos a rir. Mas a compostura era sempre mantida e os trabalhos rapidamente readquiriam o seu carácter sério e produtivo.»
quarta-feira, abril 14, 2004
Ainda Raskólnikov
Talvez o mais terrível seja perceber que ninguém nos derrotou. Que fomos nós que perdemos o jogo por desistência. Baixando os braços.
terça-feira, abril 13, 2004
Pedra sobre pedra
A nossa sensibilidade para as questões patrimoniais contém-se geralmente no castelo, na igreja, na catedral, no palacete, em tudo quanto encha o olho pela volumetria, a cércea franca ou a poeira de quatro gerações. No Algarve, assim distraídos, destruímos ou deixamos destruir diariamente um património tão ímpar como desprotegido e subvalorizado. Algum é muito recente. Mas nós precisamos primeiro da delapidação para depois nos vir o remorso dela. E assim, deixando agora que as máquinas soterrem ou reduzam a escombros os seus principais elementos, cá andaremos mais tarde de lupa e candeia à procura dos seus restos. Entretanto, não há poço, cisterna, azenha, eira, muro de pedra solta, casa de água única, torneja, reixa, açoteia ou platibanda (isto são só exemplos) que resistam a esta voracidade. Uma voracidade militante onde a ganância e a ignorância caminham a par sem se fazerem sombra.
Crime e Castigo
O problema de Raskólnikov é que não podia expiar o seu crime: pela razão simples de que não conseguia acusar-se a si mesmo. É verdade que matou. Mas o crime (essa leve falta) só o era na justa medida em que não servira para atingir os seus grandiosos fins. Preso na Sibéria, rendido, percorria-o uma indefinida inquietude e a sensação terrível de que se sacrificara sem finalidade. Deixou, portanto, de ter interesse na vida. Porque viver parecia significar apenas existir.
Mas a Primavera é assim: uma eterna possibilidade de redenção. E Raskólnikov, indiferente a tudo (incluindo o infinito amor de Sónia Semiónovna), olhou um dia o rio largo e deserto, a estepe banhada pelo sol. Tinham chegado os dias primaveris: tépidos, claros. E, de súbito, na segunda semana depois da Páscoa, sob esse impulso renovador da Primavera, toda a sua desgraça lhe pareceu exterior e superficial. E, de súbito, compreendeu que um futuro radioso era ainda possível. Que a vida podia ainda fazer sentido. Que podia escolher entre a luz e a sombra.
Na Primavera é assim: há sempre uma linha, uma fina membrana, que separa o que é e o que poderia ser. Como hoje: chego à janela, olho o dia claro, limpo, redentor, o céu muito azul, as folhas de novo nas árvores. E compreendo que é possível escolher. Mesmo que, escolhendo a luz, não nos seja ainda possível libertarmo-nos da sombra.
Mas a Primavera é assim: uma eterna possibilidade de redenção. E Raskólnikov, indiferente a tudo (incluindo o infinito amor de Sónia Semiónovna), olhou um dia o rio largo e deserto, a estepe banhada pelo sol. Tinham chegado os dias primaveris: tépidos, claros. E, de súbito, na segunda semana depois da Páscoa, sob esse impulso renovador da Primavera, toda a sua desgraça lhe pareceu exterior e superficial. E, de súbito, compreendeu que um futuro radioso era ainda possível. Que a vida podia ainda fazer sentido. Que podia escolher entre a luz e a sombra.
Na Primavera é assim: há sempre uma linha, uma fina membrana, que separa o que é e o que poderia ser. Como hoje: chego à janela, olho o dia claro, limpo, redentor, o céu muito azul, as folhas de novo nas árvores. E compreendo que é possível escolher. Mesmo que, escolhendo a luz, não nos seja ainda possível libertarmo-nos da sombra.
segunda-feira, abril 12, 2004
Península de Cacela
As garças que cruzaram a barreira arenosa, no sábado de manhã, deixando pequenas sombras na água da Ria, pareciam intemporais. Como se fossem elas as que Ibne Darrague Alcacetali, no século X, deixou que poisassem nos seus versos.
Os grãos do ópio
As papoilas, de súbito, cresceram junto às linhas de figueiras. Deve ser da excessiva acidez do terreno. Seja como for: um vermelho vivo, quase glorioso, contra o verde. E, de entre elas, as papoilas do ópio. Algum tempo depois de caídas as pétalas, cortam-se as cabeças e recolhem-se os minúsculos grãos, em estando escuros, quase secos. Antigamente, no Algarve, misturavam-se na água e levavam-se ao lume. Fazia-se um chá que se dava às crianças. Era o «chá de dormideira». As crianças dormiam que nem anjinhos. Pudera.
sábado, abril 10, 2004
[O domingo de ramos]
Não subas a escaleira
repara como a humidade deixou intactas
na parede as marcas da
fotografia do largo
um domingo qualquer depois
da primeira comunhão
O futebol, os discos pedidos, a
mesa festiva
o que procuras que não tivesse
vagarosamente sucumbido
ao exercício
da mágoa
repara como a humidade deixou intactas
na parede as marcas da
fotografia do largo
um domingo qualquer depois
da primeira comunhão
O futebol, os discos pedidos, a
mesa festiva
o que procuras que não tivesse
vagarosamente sucumbido
ao exercício
da mágoa
sexta-feira, abril 09, 2004
[o tempo:]
em meados de janeiro
olhas as amendoeiras em flor
e o que vês são já os frutos
como se estivesses na casa do Verão
a olhar as árvores carregadas de frutos
e sentisses por um instante atravessar-te
a memória (uma saudade terrível
das amendoeiras em flor
olhas as amendoeiras em flor
e o que vês são já os frutos
como se estivesses na casa do Verão
a olhar as árvores carregadas de frutos
e sentisses por um instante atravessar-te
a memória (uma saudade terrível
das amendoeiras em flor
quinta-feira, abril 08, 2004
[podes estar longe]
Os Incêndios
di-lo em voz alta
compreendes agora como é
poderosa a arte da evocação?
em vez de subir a encosta correr
os montes em vez
de olhar uma a
uma cada uma das árvores mortas onde
lavrou o fogo
di-lo apenas em voz alta
Os Incêndios
podes estar longe
podes ter os olhos fechados
a poderosa arte da evocação
di-lo em voz alta
compreendes agora como é
poderosa a arte da evocação?
em vez de subir a encosta correr
os montes em vez
de olhar uma a
uma cada uma das árvores mortas onde
lavrou o fogo
di-lo apenas em voz alta
Os Incêndios
podes estar longe
podes ter os olhos fechados
a poderosa arte da evocação
[tarde aprendemos]
era um jogo da infância
havia sempre menos cadeiras que crianças não
não foi teres perdido a vez
na realidade não havia Nenhuma cadeira
onde alguém pudesse sentar-se
havia sempre menos cadeiras que crianças não
não foi teres perdido a vez
na realidade não havia Nenhuma cadeira
onde alguém pudesse sentar-se
quarta-feira, abril 07, 2004
[o Olhar]
um azul que ninguém
nenhuma voz
quer dizer
nenhuma imagem
quer dizer o voo das aves
uma árvore
o céu de junho
quer dizer
nada no mundo se compara
ao modo como Olhas o mundo
nenhuma voz
quer dizer
nenhuma imagem
quer dizer o voo das aves
uma árvore
o céu de junho
quer dizer
nada no mundo se compara
ao modo como Olhas o mundo
[dos limites da Linguagem]
as palavras ou
seja
a gramática não garante
necessariamente uma ordem
ou seja não
convoca necessariamente
não une ou
seja
terás razão ao insistir que
estes jogos de Linguagem estão
usados
ou seja
em boa verdade é como se já
não tivéssemos Nada
que dizer um ao outro
seja
a gramática não garante
necessariamente uma ordem
ou seja não
convoca necessariamente
não une ou
seja
terás razão ao insistir que
estes jogos de Linguagem estão
usados
ou seja
em boa verdade é como se já
não tivéssemos Nada
que dizer um ao outro
terça-feira, abril 06, 2004
Uma história infelizmente verdadeira
Em Maio de 2000 foi promulgada legislação enquadradora de um «conjunto de medidas de política de acção económica a médio prazo com vista ao desenvolvimento estratégico para os diversos sectores de actividade da economia portuguesa». Neste âmbito, foi identificado «um conjunto de produtos que incide particularmente sobre o aproveitamento e valorização do património edificado e o turismo de natureza e sustentável, desportivo, de cultura e de negócios».
Este sistema de incentivos, designado por SIVETUR, apoia que tipo de projectos? Apoia «projectos de recuperação ou adaptação de património classificado», «projectos de turismo de natureza», «projectos de turismo sustentável, localizados em áreas protegidas e em áreas contíguas a estas» e, finalmente, «projectos de animação turística», onde se incluem os campos de golfe, as marinas ou portos de recreio, os centros de congressos e os parques temáticos.
Este sistema de incentivos, no Algarve, assume uma especial importância. Desde logo, ao apostar na diversificação de produtos turísticos e ao enfatizar os projectos no domínio da defesa e valorização do património e que se integrem no conceito de «turismo sustentável».
Pois muito bem. Imagine agora um lorpa que, cedendo à tentação de transformar em betão seis hectares de pomares e hortas, decide avançar com um projecto enquadrado pela alínea do «turismo sustentável». Agro-turismo, por exemplo. Faz o projecto, avança com os estudos de viabilidade económica, e apresenta-se nos balcões do SIVETUR. E imagine que não lhe aceitam a candidatura. Porquê? Porque ao contrário das marinas e dos campos de golfe, o apoio aos projectos de turismo sustentável está dependente «da existência de um plano de acção acordado entre a entidade gestora da respectiva área protegida, uma entidade a indicar pela Secretaria de Estado do Ordenamento do Território, uma entidade a indicar pela Secretaria de Estado do Turismo, um representante dos respectivos órgãos regionais de turismo e as autarquias que integram o respectivo território ou que com ele sejam contíguas». Imagine que o lorpa pergunta: mas então o plano de acção não está ainda elaborado? E que lhe respondem: não, ainda falta acertar uns pormenores. E que o lorpa insiste: mas não se passaram já quatro anos desde que saiu o Decreto-Lei nº 70-B/2000, de 5 de Maio? E que respondem: sim, é verdade, mas sabe como é.
É, a gente sabe. Os apoios previstos para o turismo sustentável, neste momento, quatro anos depois de aprovados em Conselho de Ministros, não foram ainda operacionalizados. No Algarve não é grave. Sempre se pode avançar com um loteamento em vez dum projecto de agro-turismo, ou arranjar parceiros para construir mais uma marina ou um campo de golfe, para os quais o SIVETUR tem apoios. E não são necessários planos de acção. Basta o discernimento estratégico.
Este sistema de incentivos, designado por SIVETUR, apoia que tipo de projectos? Apoia «projectos de recuperação ou adaptação de património classificado», «projectos de turismo de natureza», «projectos de turismo sustentável, localizados em áreas protegidas e em áreas contíguas a estas» e, finalmente, «projectos de animação turística», onde se incluem os campos de golfe, as marinas ou portos de recreio, os centros de congressos e os parques temáticos.
Este sistema de incentivos, no Algarve, assume uma especial importância. Desde logo, ao apostar na diversificação de produtos turísticos e ao enfatizar os projectos no domínio da defesa e valorização do património e que se integrem no conceito de «turismo sustentável».
Pois muito bem. Imagine agora um lorpa que, cedendo à tentação de transformar em betão seis hectares de pomares e hortas, decide avançar com um projecto enquadrado pela alínea do «turismo sustentável». Agro-turismo, por exemplo. Faz o projecto, avança com os estudos de viabilidade económica, e apresenta-se nos balcões do SIVETUR. E imagine que não lhe aceitam a candidatura. Porquê? Porque ao contrário das marinas e dos campos de golfe, o apoio aos projectos de turismo sustentável está dependente «da existência de um plano de acção acordado entre a entidade gestora da respectiva área protegida, uma entidade a indicar pela Secretaria de Estado do Ordenamento do Território, uma entidade a indicar pela Secretaria de Estado do Turismo, um representante dos respectivos órgãos regionais de turismo e as autarquias que integram o respectivo território ou que com ele sejam contíguas». Imagine que o lorpa pergunta: mas então o plano de acção não está ainda elaborado? E que lhe respondem: não, ainda falta acertar uns pormenores. E que o lorpa insiste: mas não se passaram já quatro anos desde que saiu o Decreto-Lei nº 70-B/2000, de 5 de Maio? E que respondem: sim, é verdade, mas sabe como é.
É, a gente sabe. Os apoios previstos para o turismo sustentável, neste momento, quatro anos depois de aprovados em Conselho de Ministros, não foram ainda operacionalizados. No Algarve não é grave. Sempre se pode avançar com um loteamento em vez dum projecto de agro-turismo, ou arranjar parceiros para construir mais uma marina ou um campo de golfe, para os quais o SIVETUR tem apoios. E não são necessários planos de acção. Basta o discernimento estratégico.
[Os estrangeiros]
Nómadas, volúveis
só o logro os aproximava ainda da
memória da neve
dos caminhos subindo a
encosta pelas curvas de nível
das margens onde o inverno
vagarosamente
depunha as argilas luminosas
só o logro os aproximava ainda da
memória da neve
dos caminhos subindo a
encosta pelas curvas de nível
das margens onde o inverno
vagarosamente
depunha as argilas luminosas
segunda-feira, abril 05, 2004
[Um tema dos «the the»]
Foi a melhor compra que fizeste
o equalizador
como é possível que esta música
nunca passe na rádio
pára depois da curva, desliga
os faróis
vê como a névoa erguendo-se no
vale anuncia a manhã
é como se tudo nos pertencesse
como se tudo pudesse pertencer-nos
tudo o que realmente importa no mundo
a música, sei lá
o amor
o equalizador
como é possível que esta música
nunca passe na rádio
pára depois da curva, desliga
os faróis
vê como a névoa erguendo-se no
vale anuncia a manhã
é como se tudo nos pertencesse
como se tudo pudesse pertencer-nos
tudo o que realmente importa no mundo
a música, sei lá
o amor
Os limites
No início dos anos 20, a pintura de Mondrian caminha para a depuração formal, para a simplicidade máxima de uma trama de linhas ortogonais e pequenos rectângulos de cores primárias. Van Doesburg, seu antigo companheiro de aventuras estéticas (que vinham antes ainda do tempo da revista De Stijl), traiu estes princípios ao permitir-se a heresia de desenhar linhas diagonais. Estávamos em 1925. Mondrian viu um destes quadros e nunca mais lhe falou.
Carlos Alves, numa noite de Novembro de 1996, fez uma renúncia num jogo de sueca. Fernando Pires, seu colega e amigo íntimo desde a escola primária, poisou as cartas, levantou-se da mesa e nunca mais lhe falou.
É assim. Há coisas em que não é possível transigir.
Carlos Alves, numa noite de Novembro de 1996, fez uma renúncia num jogo de sueca. Fernando Pires, seu colega e amigo íntimo desde a escola primária, poisou as cartas, levantou-se da mesa e nunca mais lhe falou.
É assim. Há coisas em que não é possível transigir.
domingo, abril 04, 2004
O Inverno
Gosto do Inverno porque gosto do Verão. Gosto da chuva e da tempestade porque gosto dos dias claros sem uma nuvem. Gosto do vento e da neve porque gosto do sol a pique sobre a terra castanha. Gosto do Inverno porque é preciso o Inverno para termos saudades do Verão.
Um dia
[fala Krugger, em Amado Monstro]
Sempre temi esse dia
em que um espelho me devolveria
as imagens verdadeiras.
Sempre temi esse dia
em que um espelho me devolveria
as imagens verdadeiras.
quinta-feira, abril 01, 2004
São outros países...
Parece que as chamadas para o INEM faladas em inglês e francês têm maior probabilidade de não serem socorridas do que as efectuadas em português ou espanhol. Isto é inadmissível... É bem verdade que somos um país atrasado... Eu vou contar uma história. No início do ano, em Berlim, liguei para o serviço homólogo do INEM na Alemanha e expliquei-me assim: «Bom dia. Olhe, menina, desconcentrei-me aqui no cruzamento da Friedrichstr. com a Mittelstr. e derrapei. Subi um lancil e torci o pescoço. Podiam fazer o obséquio de me enviar um médico?». E a verdade é que a senhora, do outro lado da linha, respondeu-me logo. Num tom interrogativo, é certo, mas respondeu. Dizia «vasse?, vasse?», ou coisa que o valha. Via-se que estava preocupada. Que me queria ajudar. Ou seja, ela deve-me ter percebido, eu é que não a percebi a ela.
São outros países...
São outros países...
O cão polícia da SIC
O episódio de hoje chamava-se «Atentado contra o Rex». Saí do restaurante logo depois do começo do episódio, portanto não segui o enredo. Mas fiquei preocupado. Espero que o bicho não morra. Só faltava ficarmos privados de mais uma série de culto por culpa do argumentista.
As tardes de sábado
O preço dos combustíveis, desde o início do ano, tem aumentado de quinze em quinze dias. Sei estas coisas porque leio jornais. De resto, e até ver, o problema não me tem afectado particularmente. Nas tardes de sábado vou a Ayamonte, ali mesmo à beirinha de casa, e encho o depósito. (O patriotismo leva-me a escolher a Galp.) Poupo 10 euros. Aproveito e como umas tapas. Passo pelo supermercado e compro carne, leite e iogurtes: são mais em conta. Só depois regresso e só então costumo comprar o Expresso e ler os editoriais de José António Saraiva.
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