sexta-feira, março 11, 2005

Cesto da gávea

Hoje apareceste-me num soneto de lua, pendurada no cesto da gávea onde os sinais da vida se procuram gota a gota, nas manchas de ausência de cor. Sei que fui cruel, que afrouxei o corpo, e me abandonei à dureza fotográfica de um momento de cansaço, de um soluço de respiração onde duvidei que estava vivo. Sei que perdi a memória, já não sei o que faço aqui e magoo-te a cada passo, por mais leve que o tente dar. Perco-me e faço-te perder a beleza de todos os instantes de lume e ar que se estatelaram nos nossos corações e que por comodidade se guardaram na velha gaveta da cómoda de pinho amarelecido. Perdoa-me o desastre e todo o mar triste que agora te trago. De bom grado abandonaria este leme frágil, se não temesse as sombras que me esforço por esquecer porque, pelas asas que te corto, morro para sempre de aflição.